quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Trechos do livro: ERAM UMA VEZ, MORANGOS...

(...)Era uma sexta comum, saíra por aí como quem só quer aproveitar a cerveja gelada e enojar das mesmas caras da cidade provinciana. Buraco dos Ratos era a taverna da qual escolhera para soltar altas gargalhadas enfeitadas pelo forte teor alcoólico. 02h: 26min da matina do dia 7 para o dia 8 - como se o destino proclama-se algo impetuosamente CAPITAL vindo do sete para ficar ETERNO como o oito deitado. Eu sou este moço que está perto do balcão de blazer preto surrado, blusa branca por dentro extra grossa para o frio não congelar meu pescoço quando sair daqui, e uma calça jeans cinza, meus óculos tortos e com grau baixo para minha vista cansada, meu cabelo normal, igual de todos os homens. Com a cerveja ao lado encima do balcão, um copo na mão esquerda e um laboratório completo para cuspir veneno, sinto algo escorrer no canto da boca, pego um lenço vermelho que está no bolso da frente no peito esquerdo, limpo o canto da boca e coloco-o de volta, lembro-me do passado e vejo a criança me puxar levemente pela calça, olhando-me para abaixo a vejo, subitamente ignoro, olhando para o nada a frente novamente, me ateio no pensamento, percebendo o quanto me faz falta aquele ópio de cores vivas, intensas, que um dia já pintara meus melhores quadros. Hoje só me sobra os pulsos, o pincel e minhas cores mortas, todos se foram para a falsa terra de Nazaré, que ao tempo dado já deve ter se desgastado, sobrando a mim somente as obras feitas, obras maravilhosas, desgastantes, mas maravilhosa, obra digna de um artista apenas. Sinto um leve puxão na minha calça, simplesmente ignoro-me com mais um gole de cerveja. Ponho a mão direita no bolso do blazer, puxo um cigarro de tarja – céu. Acendo-o sempre com certo charme, daqueles tipos de vilão – da – noite - filho – da – puta – petulantemente - depravado, que conjectura sempre gostar de finais felizes, mas não gosta, porque a desgraça tem muito mais paladar quando misturada a outros sabores, porque só existe glória naquilo que é superado e – ou derrotado pela suas mãos. Não é Sade, não é Thanatos, e sim Eros em seu magnífico primor – idéia que atravessa as várias possibilidades de manifestação de energia dando sentido a uma gama variada de acontecimentos (seja ele bom ou ruim) promovidos pelas forças de atração da matéria inanimadas (ser humano) até aqueles dependentes de sentimentos humanos gregários como o amor, a sexualidade, o carinho, a solidariedade; porque o ponto altivo de qualquer coisa torna-se tão óbvio, exato e demasiado, que é necessário descer um pouco ou bastante? Por uma necessidade inata de sempre estar em movimento. Existem pessoas que preferem roer unha, puxar os pequenos fios da sobrancelha, ranger dentes ou ficar balançando a perna freneticamente num compasso desconhecido de uma sinfonia que está querendo sentir, mas não sabe nem como tocá-la e muito menos ouvi-la, porque jamais sabe o que quer. Sempre ansiando alguma coisa, mas nunca sabe o que espera. Eu? Prefiro viver, não espero, vou atrás, procuro em todos os cantos sabendo o que quero. Satisfações e insatisfações e nada mais, só viver. Não gosto da simplicidade, para mim, tudo tem que ter o encanto do complexo e incompreensível, sobrevir muitas das vezes nos passos falsos da satisfação barata e rápida, e no final tudo fica só o vazio do pleno mesmo sabendo que o vazio de tudo tem sua plenitude por ter o seu valor a que muito lhe é parecido conosco, o nada. E é esta plenitude que nos atemoriza. Nós mesmos. O solo. É um mal de todo romântico nesta terra cair nestes delitos - acreditar demais, acreditando de menos em si muitas das vezes. Mas, como o “todo sempre” existe a sua salva exceção, há uma pequena coisa que difere a razão e o sentimento de um romântico, pois o amor do romântico por si irá oportunizar sempre uma chance de renovar-se perante o fogo que não arde, que dói, mas não se sente.

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